sexta-feira, 3 de setembro de 2010

PORQUÊ NÃO TEM “ROSTO” AS MANIFESTAÇÕES DE SETEMBRO

A busca pelo rosto das manifestações que eclodiram nas cidades de Maputo e Matola e que tiveram uma extensão pouco significativa por pequenos pontos do sul do país, constituí o grande factor de estudo por vários actores sociais, sobretudo para se chegar a uma conclusão evidente do que se reivindica e como observar uma solução para o que se reivindica.

Porém, o facto de não se encontrar facilmente um rosto para esta manifestação é a partida sinónimo de que ela está sendo executada pela sociedade, por todos nós, apenas com a diferença de alguns tomarem atitudes mais exacerbadas e até mesmo arruaceiras se assim quisermos apelidar, mas que não deixam de ter o seu impacto destrutivo, assim como, o seu impacto no âmbito do task force politico junto do Governo.

Quando levanto a hipótese de emprestar um rosto invisível (a sociedade) para estas manifestações, sou obrigado a trazer alguns exemplos que melhor clarificam esta tese. É preciso estarmos conscientes que as mensagens que foram circulando pelos telemóveis, não escolhiam sequer idade, côr, filiação política, grupo étnico ou linguistico e elas foram disseminadas dentro dum raio, apelando a um determinado comportamento, e como resultado desse apelo, os transportadores semi-colectivos vulgos xapas, nos dias 1 e 2 de Setembro não circularam, as autoridades policiais emitiram uma declaração pública afirmando não ter recebido nenhum pedido de realização de manifestação, os órgãos de comunicação social já tinham escalonado suas equipes de reporters pelos bairros para cobrir as manifestações como também o fizeram as forças policiais fortemente armadas.

Ora, essa descrição acima feita conduz-nos a uma situação em que fica claramente vísivel que no seio dos actores sociais ao nível de Maputo afinal estavam todos preparados e avisados para as manifestações, não se sabendo apenas por onde elas haveriam de deflagar. Bastou o cenário ter iniciado, rapidamente se repercurtiu um pouco por todos os bairros e o material ha muito preparado para esta manifestação foi usado com grande facilidade.

Facto interessante é que a sociedade invisível, mentora da manifestação emitiu o seu comunicado via sms “ não vamos parar antes que o governo anuncie a redução ou manuntenção dos preços”, e sentimos que essa sms chegou ao governo ou melhor que os canais de comunicação entre o governo e os manifestantes há muito tinha sido definido.

Foi em razão desse dialogo que S.Excia o Presidente da República emitiu seu comunicado apelando a calma, declaração antecedida por reuniões do bureau politico do partido no poder e dia seguinte do encontro tão esperado do Conselho de Ministros, que terminou com um comunicado que não respondia as reclamações da “sociedade invísivel”, e pelo contrário chamavam a sociedade moçambicana ao trabalho para aumentar o nível de produção interna e elevar as exportações.

Do ponto de vista de análise política, há vários aspectos a sublinhar, primeiro dos quais que este fenómeno representa o emergir ainda que numa fase latente de uma consciência social colectiva, em que classe baixa e media convergem as suas preucupações e chamam a “elite política” a uma governação sobre pressão, uma situação para o qual as autoridades políticas não estão preparadas e é preciso sublinhar que não há treino possível para controlar uma convulsão social. Contudo é preciso reconhecer que alguns segmentos politicos marginalizaram os impactos de uma escalada a todos os níveis de produtos de primeira necessidades, de services básicos enfim uma subida em todos e a todos os níveis.

Por outro lado, outra leitura que somos chamados a fazer é o contexto em que as manifestações eclodem, em que estamos perante a um agravamento dos preços sem equilibrio sobre os salarios, sobretudo o salário minímo, numa conjuntura em que o metical vai derrapando face as moedas estrangeiras sobretudo o rand moeda de importação, não há quem se salve, esta situação afecta aos politicos de esquerda aos de direita, afecta ao polícia, ao medico, ao investidor ao cliente, sendo este o factor que conduz a que a manifestação tenha sido levada a cabo pela sociedade em geral.

Citando o comunicado do Conselho de Ministros, sobre o levantamento das manifestações quando se refere que “Dos actos destrutivos, resultantes da agitação, do dia 01 de Setembro, resultaram em elevados danos humanos e materiais, e outros prejuízos, nomeadamente, 6 mortos, 288 feridos, 23 estabelecimentos danificados e saqueados, 12 autocarros vandalizados sendo um totalmente destruído, dois vagões contendo milho e cimento saqueados, cinco viaturas e duas motorizadas queimadas, quatro postes de transformação de energia queimados e duas bombas de combustível vandalizadas. Em termos globais, estes prejuízos, da avaliação preliminar, estimam-se em 122 milhões de Meticais, montante correspondente a uma perda de pelo menos, 3.910 postos de trabalho” me parece que com deste levantamento não se pode apenas dizer que esses actos só podem ser perpetrados por marginais, vandalos e oportunistas, devemos também procurar reflectir a caracterização da sociedade produtiva em Moçambique e concretamente nas cidades de Maputo e Matola, para podermos compreender que estes grupos constituem a maior parte da sociedade, e que a questão de desemprego e de falta de oportunidade leva a estas situações, e se quisermos ir mais longe, se não trabalharmos urgentemente para reverter o quadro, chegaremos a conclusão de que este é o rosto visível das cidades de Maputo e Matola.

Precisamos recordar José Craveirinha, quando se refere que Chamanculo é para Maputo o que Maputo é para Moçambique, para responder alguns segmentos sociais que se perguntam se os preços sobem em todo o país, porquê apenas na cidade de Maputo e Matola é que se registam as manifestações. Para os analistas políticos isso não deve ser difícil de explicar mas para os decisores políticos, que se agarram a dimensão do país e reconhecem os esforços que desenvolvem custa-lhes perceber que a paralisação das cidades de Maputo e Matola são em termos reais a paralisação do país todo e que precisamos com urgência estudar a criação desta conciência social colectiva porque a consolidação pode criar ainda boas surpresas boas e más.

É preciso sublinhar que até a hora do fecho deste texto, ainda se registavam algumas situações anómalas em alguns pontos, e pior do que isso, ainda não se tinha encontrado o rosto desta manifestação, mas contrariamente aos dias anteriores registou-se uma trégua colectiva e os segmentos sociais tentavam voltar a normalidade numa actuação surpreendente, isto é, como se todos vivessemos na mesma casa e programassemos as coisas na hora do jantar.