quarta-feira, 6 de outubro de 2010

“Combate a Pobreza Urbana” um novo slogan ou uma decisão em crise

Comemorou-se recentemente em Moçambique dezoito anos após a assinatura dos acordos de paz. É inegável que as manifestações de 1 e 2 de Setembro na cidade de Maputo questionaram e abalaram os alicerces da nossa paz social. Esse facto, conduziu que os políticos, o governo e a sociedade no geral fossem levados a reflectir sobre as causas e prováveis soluções para evitar que situações similares ocorram no futuro.

Como resultado desse exercício, registamos por um lado, vários opinion makers a destilarem argumentos, através dos órgãos de comunicação social que apontavam aumento do nível de produção alimentar e aumentar o volume de exportações como as grandes soluções a serem adoptadas. Por outro, o governo concluiu que havia necessidade de se prestar uma assistência especial aos centros urbanos, tendo definido como elemento da agenda central de governação o combate a pobreza urbana.

Assumindo que desde os últimos cinco anos o governo em consonância com os vários planos programáticos e agendas de governação, definiu como objectivo prioritário o combate a pobreza absoluta tendo como base o distrito, usamos esta via, para avaliar o impacto desta mudança na definição da base de orientação e da agenda política passando a centrar-se no meio urbano em detrimento do meio rural como forma de perceber em que medida esta viragem poderá influenciar no que tange ao alcance do nosso interesse nacional.

Para demonstrar o cometimento do governo no que respeita ao combate a pobreza urbana, o Ministério de Planificação e Desenvolvimento avançou que um total de 140 milhões de meticais, enquadrados no âmbito dos Fundos de Iniciativa Local, vulgarmente conhecidos como 7 milhões, passarão a partir do próximo ano, numa fase inicial a serem distribuidos em 11 municípios das 11 capitais provinciais do país.

Se nos basearmos nos estudos de Margarida Paulo et al 2007, em que considera que a “população urbana em Moçambique está estimada em 30% da população total, e que a taxa de urbanização projectada estima que até 2025 cerca de 50% da população viverá em cidades” nos parece consensual que sejam desenhadas políticas específicas para resolver os problemas das pessoas que vivem nos centros urbanos, desde que, as mesmas não sirvam para obstaculizar o alcance do interesse nacional.

Com base em vários estudos e análises concluo que existe sim, uma fraca capacidade de co-relação entre os centros urbanos e rurais, verificado por uma baixas trocas e ligações urbano-rurais, o que tem contribuído para um crescente êxodo dos campos as cidades, com impacto no decréscimo da capacidade produtiva, e em alguns casos de fraca exposição e aproveitamento dos excedentes de produção e consequentemente no aumento de níveis de preços nas cidades e por essa via, regista-se um aumento dos níveis de pobreza urbana.

Olhando para as insuficiências económicas do Estado Moçambicano que se testemunham pela volume de participação externa ao orçamento geral do Estado, sem deixar de mencionar que a nível global e interno no encontramos numa fase em que devem ser tomadas medidas de austeridade não crerio que seja razoável drenar 140 milhões ao meio urbano ao invés de consolidar e aprimorar a alocação dos Fundos de Iniciativa Local aos níveis dos distritos.

A nosso vêr o governo deveria concentrar-se em desenhar estratégias que possam garantir os projectos aprovados pelos Conselhos Consultivos Distritais sejam sustentáveis e que estejam cada vez mais ligados com os sectores da cadeia de produção e sobretudo procurando buscar mecanismos que garantam retorno dos fundos alocados.

É preciso sublinhar que a intervenção que o governo é chamado a executar no meio urbano deve estar relacionada com o melhoramento da rede de transportes públicos; aumento e expanção da rede eléctrica e de abastecimento de água, tornar eficiente e flexível a resposta das instituições públicas em relação as petições dos cidadãos; aumentar o nível de controlo e de fiscalização sobre os agentes comerciais; procurar garantir segurança e seguridade aos cidadãos e sem dúvida combater o nível de corrupção no seio dos agentes do Estado que em muito tem minado o ambiente de negócios e servindo para inflacionar os níveis de preços.

Avaliação feita pelo académico Castel-Branco na edição 1163 do Canal de Moçambique quando se refere que “nos últimos 15 anos, a taxa do crescimento do país varia entre 7% e 7,5%, mas a taxa da produção é de 1,2%” é um dado indicador de que é realmente no distrito, onde se encontra a maior parte da populacão agrícola e onde se encontram grande parte das terras arraveis para onde deve ser concetrada a nossa linha de orientação política por forma a se tornar exitosa a nossa luta contra a pobreza absoluta.

Alteração que se pretende efectuar, focalizando a agenda política no meio urbano poderá contribuir para que nos afastemos do nosso verdadeiro interesse nacional. Queremos adiantar que a serem tomadas as medidas que estão em curso, a breve trecho vamos aumentar a economia de serviços, o volume de importações e no plano geral estas medidas vão servir como factor de atracção da deslocação massiva dos campos as cidades, degradando cada vez mais o nosso tecido produtivo que deve ser concentrado ao nível do pólo do desenvolvimento.

Estamos conscientes que as convulsões sociais precisam de respostas, mas nos parece que esta não é de todo a resposta adequada ao momento em que vivemos. Pela forma como se observa esta titubeante alteração da base de orientação política só se pode enquadrar na situação de crise em que se viveu e continuamos mergulhados.

O que o país precisa é de um distrito com uma capacidade produtiva em condições de abastecer os centros urbanos, uma espécie de vasos comunicantes. Porque ao país já não é permitido errar, aproveitamos apelar para que as nossas decisões sejam fruto de profundas análises para que a razão não nos volte a chamar num futuro breve a recuarmos para uma agenda que até estava em fase de consolidação.