sábado, 6 de junho de 2015

Da pouca leitura a grande interpretação- Texto de : Odibar J.Lampeao

Acostumei-me a informar-me pouco, não pela aversão a informação, mas pelo poder que ela tem sobre o cidadão, descoberto nas minhas “suficientes” leituras. Então essas pequenas leituras, no âmbito da informação, têm-me influenciado a não saber ser um bom cidadão ao mesmo tempo que me doam certo espaço para acreditar que o pouco que sei me basta para concluir que isso de bom cidadão é relativo. Mas o problema não está nisso. O problema é que, recentemente, cada vez mais que procuro pouca informação, encontro a mesma informação se dilatando e assumindo características de muita informação. Nesse caso, acabei esgotando os meus gigabytes para tal. Sucede que no meu país ocorre uma greve do pessoal da saúde. Generalizo. No início, como os dias me têm convencido que eu e minha família estamos bem de saúde, a pouca informação se fazia sentir como mais uma informação. A vida continuava. Aliado a isso, a experiência de outras pequenas informações me fizeram crer que em pouco tempo tudo voltava a normalidade. Mas assim não sucedeu. Então para me distrair, procurei informar-me sobre outras coisas, ficar no facebook ou então para não estar na mesmice, e ao mesmo tempo não me convencer que perdia tempo, uma e outra vez clicava em alguns blogs ou páginas de internet. Essa decisão me surpreendeu bastante, como a seguir explico, depois de enumerar três pontinhos. 1. Visitei um blog intitulado Sociologia, e acabei consumindo uma também pequena informação girando em torno de um conceito novo para mim, a teatrocracia. Este conceito é trazido por George Balandier, segundo os autores do blog, para explicar o exercício e as relações de poder. Então percebi, com base na acepção deles (os citadores e o citado), que o poder político é sempre uma teatrocracia, sendo o poder que se exerce com uma característica dramática procurando legitimação. Falam ainda que qualquer poder exercido através da força acaba sendo débil por dispensar a legitimação - o reconhecimento pelos seus dominados, encontrando sempre a revolta ou insubordinação. Então, para que o poder perdure é necessário que se revista de outras aparências, onde os políticos são actores a tempo inteiro e dão vida a um espetáculo que legitima o seu poder pelas emoções que irão estimular nos dominados. Finalizando afiançam que para que se mantenha o poder é necessário cada vez mais encenação de modo que os espectadores continuem animados na peça teatral. 2. Tendo sido suficiente essa pequena informação parti para outro blog, de nome Sociologia e Antropologia. Deparo-me com um autor chamado Pierre Bourdieu, que fala de poder simbólico. Sendo esse poder apresentado de forma invisível mas que só é exercido com a cumplicidade daqueles que estão sujeitos a esse poder. Ele afirma que o poder simbólico é um poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é obtido pela forca física ou económica e só se exerce se for reconhecido, o que significa que ele acaba sendo ignorado e passando despercebido, assumindo-se como uma forma irreconhecível e legítima. Os dominados acabam estando na dominação inconscientemente (se me permitir concluir assim) porque a relação se assemelha a que se estabelece entre o crente e sua religião. 3. Depois do segundo blog, cansado com o reflexo da luz do monitor, decidi folhear certas páginas da vigésima edição do livro de Michel Foucault intitulado Vigiar e Punir. Este tornou a minha procura de pequenas informações mais interessante. Quando passava os olhos as letras do primeiro capítulo, me deparo de novo com a palavra poder (quão doce é ela!). Entre letras seguintes percebe-se que em certas vezes, o poder encontra disfunções. Essas disfunções provêm de um excesso central, que ele chama de “superpoder” que identifica o direito de punir com o poder pessoal do soberano. Assim percebem-se consequências práticas verificáveis até no que parece se opor a ele e tencionar limitar seu absolutismo. E ele, o rei (a pessoa que detém o poder na abordagem da obra), por razões de tesouraria, se arroga o direito de vender ofícios de justiça que lhe “pertencem”, tendo diante de si magistrados, proprietários de seus cargos, não só indóceis, mas ignorantes, interesseiros, prontos ao compromisso. Então ele multiplica os conflitos de poder e de atribuição, exercendo um poder muito rigoroso sobre sua “gente” e lhes confere um poder quase discricionário que ele intensifica os conflitos na magistratura. Assim, cria tais conflitos aliados a um excesso de procedimentos e medidas administrativas e parte para a paralisação da justiça regular, que a torna as vezes indulgente e incerta, sendo por vezes precipitada e severa. Acabada a última leitura, tentei fazer o que renomados estudiosos da minha polis fazem. Então me questionei: O pouco que acabei de ler tem alguma relação com o que está acontecer no meu país? Fiz uma interpretação tão grandiosa que acabou relacionando os fenómenos sociais, políticos, económicos, às minhas pequenas informações. Como eram pequenas informações, talvez a minha grande interpretação não seria legítima para partilhar com quem quer que seja. Mas percebendo que quer George Balandier, Pierre Bourdieu ou Michel Foucault (e outros que somente registei para os ler depois como é o caso de Nietzsche, Weber, Marx e Max Pagès) apenas apresentavam elementos de análise próprios para um analista que não eu, desprovido de objectividade, concluí que devia ler mais para tornar minha interpretação, já grandiosa, de alguma forma legítima. O único problema é que ate lá, número significativo de pessoas irá padecer nos hospitais e nas celas (incorporo aqui a ideia medo da cela também) e muitos chefezitos de família irão encontrar o sono depois de alguns pingos de lágrimas sobre a realidade que talvez não seja, mas aparenta ser, a do "país do pandza".

Isabel dos Santos- Um caso para reflexão sobre os PVDs

Por: Nelson Charifo A empresária Isabel dos Santos vem-se debatendo contra um conjunto de preconceitos que, de alguma forma, obscurecem o verdadeiro significado dos seus sucessos empresariais. Ser mulher e ser africana são dois pontos que jogam contra o estatuto da empresária mais rica de África. Isabel dos Santos tem contra si, em primeiro lugar, o facto de ser mulher. Pesem todas as transformações a nível global, a mulher ainda não é totalmente vista como um “parceiro” de pleno direito em termos de realizações na esfera pública, seja ao nível político, empresarial ou mesmo científico. Para mais, a esposa de Sindika Dokolo é mãe de 3 filhos, e muitos não acreditam que, com o ritmo frenético da vida moderna, seja possível conciliar o papel de mãe, esposa e empresária de sucesso. E o facto de provir de África não ajuda, pelo contrário. O continente africano não é ainda o mais avançado ou desenvolvido neste aspecto, tendo ainda um longo caminho para percorrer até que seja alcançada uma posição paritária que reflicta o verdadeiro papel da mulher africana na sociedade. A percentagem de mulheres em cargos de importância é ainda reduzida, se bem que Angola já venha a dar o exemplo, como acontece ao atribuir a Bernarda da Silva a importante e estratégica função de ministra da Indústria. Neste sentido, Dos Santos é a primeira mulher da lista dos mais ricos de África, o que leva a que seja vista com alguma desconfiança. Depois, o facto de ser africana. Se numa lista de milionários africanos ela é a única mulher, nos rankings internacionais dos maiores milionários ela encontra-se entre os ainda poucos que vêm de África. Em muitos circuitos de opinião internacionais, o empreendedorismo africano ainda é visto não como o concretizar do potencial humano e natural do continente, mas como um resquício do colonialismo ou do neocolonialismo – o aproveitar de estruturas macroeconómicas herdadas do período colonial. Todavia, para todos os efeitos, hoje o continente está verdadeiramente entregue a si próprio, e se os discursos pós-coloniais lamentando a “pesada herança” já deixaram de ter eco, também é verdade que a África de hoje nada tem a ver com a do século XX. Os maiores milionários do continente surgem, à imagem dos de outras regiões do globo (América Latina, Ásia, Médio Oriente, etc.), do desenvolvimento das oportunidades económicas abertas pela globalização – o que se reflectiu também no declínio relativo da Europa Ocidental e dos Estados Unidos no plano global.