quarta-feira, 29 de abril de 2009

Um Estudo sobre a Cooperação entre África do Sul e Moçambique

A África do Sul, teve sempre um papel de destaque na Política Externa de Moçambique e vice-versa. Não se pode esquecer que Moçambique serviu de retaguarda estratégica do ANC na sua luta contra o regime do apartheid. Contudo a Política Externa definida por estes Estados no período pós-independência até ao fim do apartheid era caracterizada por conflitualidade, mas nos anos de 1990 a Política Externa de Moçambique para com África do Sul foi substituída por uma cooperação bilateral e multilateral através da SADC seguida desde a era de Mandela a Mbeki e de Chissano a Guebuza.

Entre os factores que determinaram a mudança nesta relação, fundamentalmente destaca-se a era de Nelson Mandela no comando do Congresso Nacional Africano (ANC) em Julho de 1991, após a sua libertação e de outros prisioneiros políticos a 11 de Fevereiro de 1991, que marca o fim do regime segregacionista e racista do apartheid assim como a assinatura do Acordo de Paz Nacional e o início das sessões da Convenção para uma África do Sul Democrática (CODESA) no mesmo ano, entre outros factores que tiveram impacto para conduzir uma mudança de profundo alcance não só para a África do Sul como para toda região Austral de África (Coelho et al 2002:71).

Mas para além das razões acima indicadas, nos anos 1990 foram criadas nos dois Estados condições que estreitaram as suas relações, casos da adesão da África do Sul a SADC, bem como a assinatura do acordo de paz de Roma que pôs termo a guerra civil em Moçambique, factores estes que sem dúvida constituiram uma alavanca pivotal de aproximação entre estes dois Estados.

Para conferir uma lógica de análise ao nosso estudo mostra-se importante lembrar que a base de formulação da Política Externa Sul-Africana é criada em Outubro de 1993 quando o ANC lançou o texto “Foreign Policy in a New democratic South Africa” em que se declara que o futuro da Diplomacia de Pretória será determinada pelo profundo comprometimento com a consolidação de uma África do Sul Democrática.

Este texto foi melhor esmiuçado ainda em Novembro de 1993, quando Mandela em campanha eleitoral definiu os pilares que orientariam a Política Externa Sul-Africana baseada no facto (1) de que os assuntos de direitos humanos são centrais para as relações internacionais e que uma compreensão de que eles se estendem além do político, abrançando também o económico, o social e o ambiental (2) que as preocupações e os interesses da África devem se reflectir nas nossas escolhas de política externa (3) que o desenvolvimento económico depende de uma crescente cooperação regional e internacional em mundo independente (Gallas, 18:19) onde claramente salientava como as bases da política externa sul-africana a quastão dos direitos humanos e o compromisso do país em se integrar no Continente Africano.

Foi no quadro destes pressupostos que já em 1994 num espírito de igualdade e de laços de aproximação com o ANC e Mandela no poder, Moçambique e África do Sul, assinaram um acordo de cooperação em diversas áreas, Educação, Saúde, Transportes, Energia, Alfandegas, Segurança entre outros sectores. Para dinamizar esta cooperação foi criada uma comissão conjunta entre os dois Estados, e logo os resultados começaram a despontar, onde se pode exemplificar, as infra-estruturas construídas no corredor de desenvolvimento do Maputo, a vinda de farmeiros sul-africanos para investir em Moçambique, a cooperação entre as duas polícias, entre outras realizações de carácter bilateral que foram também acompanhadas com o entreleçar do comitimento conjunto pela Integração económica na região austral de áfrica.

Com Mandela na África do Sul e Chissano em Moçambique a cooperação entre estes dois Estados tornou-se cada vez mais intensa, tornou-se uma relação de equilíbrio e igualdade enquanto Estados soberanos, criando benefícios para ambos os países de tal forma que Moçambique se tornou um dos maiores receptores de investimentos Sul-africanos passando a ser considerado um dos parceiros estratégicos da cooperação da África Sul na região . A consolidada estabilidade política e macro-económica, os incentivos ao Investimento Direito Estrangeiro (IDE) e os custos dos factores de produção são os factores que atraem os empresários Sul-Africa nos a Moçambique.

O Presidente Thambo Mbeki, que serviu como auxiliar da Presidência e Chanceler entre 1994 a 1999, quando em 1999 sucedeu a Mandela na Presidência do Estado Sul-Africano, continuou com os pilares de Política Externa desenhados por Mandela abrindo a economia sul-africana, solidifica a imagem de grandeza do Estado Sul-Africano na região e no continente, aprimora a centralização no combate aos direitos humanos e a corrupção, reforça o seu comitimento para com a região e no continente sendo o cérebro da criação da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD) na qual Moçambique participou activamente na sua concepção e direcção da iniciativa. Mbeki na sua Presidência sempre apregou que o bem estar sul-africano dependia do bem-estar do sul da Africa.sul da Africa.

Foi na era de Mbeki que as relações comerciais entre Africa do Sul e Moçambique aumentaram gradualmente, tendo Moçambique passando a ser claramente o principal parceiro comercial da África do Sul na região em detrimento do Zimbabwe. Dados que pudemos apurar junto do Centro de Promoção de Investimentos (CPI) indicam que já em 1999 as exportações sul-africanas para Moçambique foram de pouco mais de 4 milhões de rands, em 2000 ultrapassaram para 5 milhões de rands e em 2001 atingiram os 5,7 milhões de rands com algum destaque para petróleos e seus derivado, materiais de construção e veículos a motor dentre um leque de quase tudo que Moçambique importa da Africa do Sul, enquanto que a África do Sul importava em 2001 perto de 600 mil rands com particular enfoque para alumínio, crustáceos e pneumáticos atestam esta crescente fortificação das relações entre estes dois Estados.

Quando Mbeki, demite Jacob Zuma da Vice-Presidência, deixou evidente que os pilares da sua Política Externa, reflectiam em grande medida o objectivo de atingir uma consolidação junto dos círculos de apoio ocidental e no seu activismo continental em detrimento de uma priorização aos problemas económicos de classes basicamente de acesso a recursos assente na plataforma quase interropida de apoio aos nativos que foi iniciada no pós apartheid. Esta actuação de Mbeki teve reflexos no azedar das relações com Moçambique uma vez que na cooperação entre Moçambique e África do Sul persistem alguns assuntos que geram algum mal estar como o crescente nível de imigração de moçambicanos que procuram melhores condições de vida na África do sul, o crime transnacional, a partilha das águas internacionais. Mbeki, ao “parar” o apoio aos Sul-Africanos é visto como ter criado condições para o emergir do fenómeno de xenofobia na África do Sul que teve como maiores vítimas cidadãos Moçambicanos.

Com o fim da era de Mbeki, abriu-se espaço para uma nova direcção no ANC a era de Jacob Zuma, que se espera que venha ser confirmado Presidente da Africa do Sul pelo Parlamento Sul-Africano a 15 de Maio de 2009. Zuma muito antes de iniciar a corrida eleitoral, veio a Maputo, garantir o apoio do regime de Guebuza e pedir desculpas pelos actos de xenofobia. Este acto, não só testemunhou que com Zuma, a política de amizade e de cooperação entre os dois povos será continuada e aprimorada mas também demonstrou que Maputo constitui ainda uma base pivotal de enquadramento do ANC e da África do Sul na região.

Se é bem verdade que não se vislumbram no aspecto externo grandes mudanças na orientação da Política Externa Sul-Africana, é importante sublinhar que a questão zimbabweana por exemplo poderá obrigar que Moçambique assuma uma posição mais contudente para com Mugabe caso Zuma persista com o seu apoio a Tsanviguirai como sempre deixou transparecer. Este aspecto mostra claramente que as convicções e crenças de Jacob Zuma podem constituir um novo elemento na cooperação entre Africa do Sul e Moçambique assim como outros países da região, aliado ao facto de que Zuma ser considerado um líder populista o que pode em algumas situações ser confrontado em tomar decisões que respondam aos anseios da sua base eleitoral, que possam ter impactos nos interesses dos países da região.

Mas de forma geral, podemos dizer que com Zuma, com o mundial de futebol 2010, com a crescente procura de fontes de energia para indústria sul-africana, a cooperação entre África do Sul e Moçambique tenderá cada vez mais a crescer, sempre na base do win- win, ademais os grandes investimentos sul-africanos em Moçambique quer feitos no sector mineiro, no sector petrolífero, turístico e demais deverão ser salvaguardados assim como as oportunidades de emprego, de negócio, de transferência de Know- How e de tecnologia que Moçambique e Moçambicanos pretendem da África do Sul deve ser salvaguardada.